sábado, 3 de janeiro de 2009

Olha o Borda D'Água!


Com o início de dois mil e nove, é fundamental saber mensalmente o que nos diz esse vasto sedimento de sabedoria e de costumes ancestrais que é, claro está, o Borda D’Água, cuja divisa é “reportório útil a toda a gente”. Não há ano em que não me guie pelos profundos ensinamentos da octagenária revista, a qual curiosamente comprei no solarengo mês de Agosto, no dia em que embarquei numa aventura de contornos bíblicos: a viagem para o País Basco. Como não sabia se sobreviveria a tamanha provação, decidi comprar o almanaque a um simpático romeno além de meio quilo de marijuana, que vim a descobrir na estação de Vilar Formoso que era chá de tília. Assim, mesmo que falecesse, já saberia, graças ao Borda D’Água, o que iria acontecer neste ano, pelo que não perderia grande coisa, uma vez que as previsões de Célia Cadete, a directora e a única autora da revista, são infalíveis. Ora atentem nos seguintes excertos do texto que ela escreveu intitulado humildemente “Juízo do Ano”:

“Saúde 2009!
Ano com início a uma quinta-feira, dia do planeta Júpiter, símbolo da abundância.
O ano dominado por Júpiter terá um Inverno temperado, uma Primavera ventosa, um Verão temperado e um Outono chuvoso. Júpiter domina o estanho, o cristal, a safira, o coral, o âmbar e o almíscar.
Nos sabores, o doce e nas cores, o verde e o citrino.
Será o verde simbologia da esperança numa nova geração e num novo rumo para o nosso recanto chamado Portugal? (…)
Uma das preocupações neste ano que finda tem a ver com a “crise dos alimentos” a nível mundial, dominando páginas de jornais e abrindo telejornais. O ano de 2009 vem inverter a situação prevendo-se abundância de trigo e outros alimentos; a carne e o peixe não vão faltar. O vinho, esse será em abundância e de mui boa qualidade; mas atenção, há que beber com moderação e não esqueça nunca: se beber não conduza; ajude com a sua atitude a minimizar o número de mortes nas estradas portuguesas.”

Vejamos agora o que nos reserva o mês de Janeiro:

Dia 1: Lisboa, o Sol nasce às 7h. 55. Ocaso às 17h. 26 m.
Porto, o Sol nasce às 8h. 00m. Ocaso às 17h. 17 m.

Dia 31: Lisboa, o Sol nasce às 7h. 43 m. Ocaso às 17h. 57m.
Porto, o Sol nasce às 7h. 46m. Ocaso às 17h. 50m.


Astrologia

Os nativos de Capricórnio são pessoas determinadas, organizadas e perfeccionistas; de natureza solitária fazem poucos amigos e no amor são tímidos e cautelosos
Incensos – Lótus e Jasmim; Pedra – Ónix; Metal – Chumbo; Cor – Preta.

Animais

Vacinar o bovino, cavalar, ovino, caprino e os porcos contra as doenças rubras

Agricultura

Lavoura das terras e preparação das culturas de Inverno, como a da batata, iniciando-se, onde for possível, a plantação precoce.

Jardim

Semear begónias, ervilhas-de-cheiro, gipsófilas, girassóis, lírios, paciências, flor-de-lis, sécias, zinias, goivos, miosótis, etc. Colher violetas, amores-perfeitos, camélias, jacintos, tulipas, etc.

Provérbio: Minguante de Janeiro, corta madeiro

Pensamento: “Pensa como pensam os sábios, mas fala como falam as pessoas simples” (Aristóteles)

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Canto épico para um ano épico

Canto III

Depois do amplo e divino banquete, o grupo unido pela força de Zeus
dirigiu-se para a imponente Praça do Comércio, espaço dedicado à glória de Apolo.
As Moiras desfiaram então o restante lote destinado ao ano de dois mil e oito
até que a Noite Meridional esvoaçou pelos céus húmidos da cidade de Ulisses,
anunciando aos mortais e à terra dadora de cereais a entrada do novo ano.
Então todo o grupo unido pela força de Zeus desfez-se em longos abraços,
comovido por ter chegado dois mil nove, tempo grávido de desejos e esperanças.

Felizes com a alegria humana, as divinas Tágides subiram das águas do Tejo
e entoaram um cântico sobrenatural que a todos deleitou no coração,
enquanto Zeus fez explodir nos céus lacrimosos um fogo imortal.
Maravilha de se ver! Bolas de todas as cores que o arco-íris tem
explodiram no ar, cobrindo-o com um divino manto branco.
Encantados, os mortais ergueram as suas garrafas ao ar
e espalharam champanhe e espumante uns sobre os outros
para agradecer ao pai dos deuses o espectáculo único que lhes proporcionara.
Então a divina Andreia, excelente nas artes de adivinhação, tomou a palavra:
“Companheiros de tantos infortúnios, este estranho portento do poderoso Crónida
significa que teremos um ano fértil e cheio de alegria e que Ceres
não nos faltará com os seus cereais, nem Apolo com as criações artísticas.”
Assim falou e todos concordaram, pois falara na medida certa.

O grupo unido pelo força do deus da nuvem azul, ao qual se unira
o ponderado e divino Iúri, filho da Lei e da Justiça, seguiu então
para casa da popular Maria, melhor anfitriã entre as mulheres, conhecedora
de todos quantos habitam na irrepreensível cidade de Ulisses de mil ardis.
Para deleite de todos a festa continuou, até que Strikybuni de belas tranças
deliberou com voz firme para que todos no seu espírito a ouvissem:
“Companheiros de feitos imortais, segui-me até ao meu acolhedor lar,
pois declaro lá haver iguarias únicas feitas por minhas mãos virtuosas
e vinho proveniente da altiva e forte cidade da Guarda.
Acompanhai-me agora, ó companheiros, para que vos possa mostrar
a minha sólida e perene habitação onde o fogo sagrado arde todo o ano.”
Assim deliberou e todos acataram de bom grado palavras tão acertadas e justas.

No lar cálido de Strikybuni há um imenso terraço acima de todos os telhados da cidade.
Maravilha de se ver! Aí os gatos sagrados, animais de estimação da divina Afrodite,
passeiam sem medo, pois sabem que a afável Strikybuni não lhes faz mal,
o que agrada à deusa nascida do mar nunca vindimado.
Foi aí que Bojo, mortal de humanismo inigualável, Sapec, de canto gregoriano,
Rita de sorriso puro, Bukowski, de coração predisposto para a guerra, Solid,
de longas e divinas rastas que o impedem de envelhecer, a divina Andreia
e o insolente Shiva, amaldiçoado pelos deuses, se reuniram,
pois todos os outros já tinham partido para os seus lares imortais.
Strikybuni de belas tranças distribuiu então por todos
baba de camelo, iguaria que Afrodite lhe ensinara a fazer,
filhoses douradas, receita da Posídon, sacudidor da Terra,
e vinho proveniente da íngreme Guarda, cidade acima de todas as outras.
Quando todos afastaram dos seus corações o desejo de bebida e comida,
a divina Rita, filha de Santo António dos Cavaleiros, combatente na guerra dos Titãs,
tomou então a palavra para que todos no seu espírito a escutassem:
“Companheiros de todos os bons e maus momentos, pressinto no meu coração
que a que cedo desponta, a Aurora de róseos dedos, não tardará a aparecer
para dar luz aos deuses, aos homens e à terra dadora de cereais.
Mas antes disso quero sacrificar no meu lar acolhedor
doze touros sagrados em memória dos meus antepassados
para que de mim se não esqueçam e me favoreçam sempre.
Aproveito por isso para me despedir e agradecer a todos
esta noite, que não esquecerei enquanto o nevoeiro da Morte
não se derramar sobre os meus verdes e brilhantes olhos.
Espero que todos agarrem dois mil e nove com as duas mãos
e espremam dele tudo o que de bom estiver reservado para vós.
Obedeçam aos deuses e nada vos faltará na terra dadora de cereais.
Um óptimo dois mil e nove, ó companheiros irrepreensíveis!”

Assim disse e aos presentes agradou o equilibrado discurso,
pois dissera todas as palavras na medida certa.
O divino Bojo, mortal de um humanismo inigualável,
Sapec, homem dado a hospitais e ao canto gregoriano,
assim como Solid, de rastas imorredouras, e a divina Andreia,
aproveitaram também para se despedirem e partirem
para os seus sólidos lares, para se deitarem em seus leitos imaculados.
Ficaram em casa de Strikybuni de belas tranças o belicoso Bukowski
e o insolente Shiva, amaldiçoado pelos deuses por ter desrespeitado Afrodite.
Ambos pernoitaram aí, até que a Aurora de róseos dedos surgiu no firmamento
para anunciar aos mortais e à terra dadora de cereais um novo ano no Mundo
governado pelo portentoso Zeus, detentor da égide.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Canto épico para um ano épico

Canto II

No restaurante Miradouro de Santa Luzia, divina entre as mulheres, havia dez mesas
distribuídas por dez salas ornadas por colunas de ouro, obra do imortal Hefesto,
e em cada uma das mesas distribuíam-se acepipes e manjares a perder de vista.
Aqui fumegava um colossal porco de brancas crias ladeado de batatas douradas;
ali a irrepreensível Ceres transformara o pão em migas deleitosas
às quais Neptuno acrescentara gambas, camarões e outras iguarias
provenientes do fundo do mar nunca vindimado pelos mortais.
Além, espetos incomensuráveis de carne de cabritos de casco não fendido
ornado com arroz imaculado preenchia todo o comprimento de uma das mesas
e em todas elas o divino Dionísio distribuíra inúmeras garrafas de Lello,
vinho doce feito a partir de vinhas imortais que crescem no Olimpo sagrado.

O belicoso Bukowski tomou então a palavra ao contemplar tamanhas iguarias:
“Companheiros de duras jornadas, vejam como os deuses nos favorecem com manjares
que nunca outros mortais puderam alguma vez saborear ou mesmo ver.
Que nenhum de nós faça cerimónia, mas que coma e beba em abastança
para que as divindades nos dêem um ano fértil e pleno de alegria.
Por minha parte estou disposto a comer este imenso javali que Apolo abateu
nas inóspitas florestas da Gardunha, onde nenhum homem consegue entrar,
pois são guardadas por terríveis baronesas que têm a sua morada em Alpedrinha e que são a perdição dos jovens estultos que se deixam apaixonar pelos seus olhos viciosos.
Comamos e bebamos, sofredores companheiros, e assim honraremos os deuses.”

Assim falou e todos os presentes assentiram, pois falara na medida certa.
Depois de terem feito as libações a Zeus Crónida, e aos outros deuses,
todos sem excepção lançaram mãos às iguarias divinas que jaziam sobre as mesas.
Quando afastaram o desejo de comida e bebida dos seus corações,
Sapec, de suave canto gregoriano, tomou a palavra para que todos o escutassem:
“Companheiros excelentes em auxílio, hoje estamos aqui, amanhã onde estaremos?
A única coisa que sabemos é que os deuses louvaremos e Lello beberemos.
Antes de continuarmos pela Noite dentro, ó companheiros, lembremo-nos
dos nossos amigos que não estão aqui connosco, sacrificando no lume de Hefesto
estas vísceras de veado de grande porte que Atena privou de Vida para nosso deleite.”

Ajuda-me agora, ó Musa, a recordar os nomes invocados no banquete imortal.
Strikybuni de belas tranças recordou a ágil Libelinha, sua companheira de viagens
que fora até à ventosa Viseu, cidade divina mas habitada por terríveis ninfas.
Bojo lembrou o irmão gémeo Manolo, excelente em táctica de guerra,
que os deuses retiveram na fria Serra da Estrela coberta por neves imortais.
Também o sofredor e apaixonado Xicoxico e o imenso Metal foram invocados,
eles que ficaram na estéril cidade do Fundão juntamente com os familiares, assim como o capitão Marco, entrincheirado por Ares, flagelo dos homens,
na lacrimosa Leiria, onde uma terrível guerra estava prestes a rebentar.
Leninha, de puros olhos; Paulinha, filha de Ícaro; Rita, da cidade de Lilliput;
a bela Catarina, irmã do sofredor Xicoxico; Marrusso, de divinos cabelos loiros;
o inclemente Llera; Romina da montanhosa Buenos Aires; Bob@alfa, filho de Cupido,
e Biológico, de viçosas rastas, irmão de Psynoia, de rastas divinas,
todos eles foram agraciados com palavras bondosas por parte dos comensais.

Canto épico para um ano épico

Canto I
Fala-me, Musa, do grupo unido que se encontrou no último dia do ano,
depois de tantos meses disperso pela trama irreversível do destino.
Muitas foram as cidades por onde vaguearam e os povos que conheceram
e muitos os perigos que enfrentaram, não sem bravura, para salvarem a vida
e para se reencontrarem por fim, sãos e salvos, no crepúsculo de dois mil e oito.
Mas nem todos puderam comparecer no banquete de boa memória.
Não, o poderoso pai dos deuses reteve alguns junto dos seus familiares
para que honrassem com suas presenças a memória dos progenitores
e vigiassem os costumes ancestrais das terras que os viram crescer.
Destas coisas fala-nos agora, ó deusa, filha de Zeus.

Junto à imorredoura Sé construída pela força imortal dos antepassados
encontraram-se Sapec, de suave canto gregoriano, e Rita de sorriso puro;
Strikybuni, de belas tranças, também pontificou com a sua presença
assim como o bélico Bukowski, filho do terrível Ares, flagelo dos homens.
De Alfragide escarpada surgiu Bojo, mortal de humanismo inigualável,
enquanto da aquosa cidade de Algés vieram Solid, de rastas divinas,
e a divina e sofredora Andreia, filha da grega Helena de belos cabelos.
Hermes trouxe Ginjas de veneráveis caracóis e Sic, neto da estridente TVI.
Da desértica margem sul, onde o imortal Sol abrasa a Vida com seus raios,
vieram o latino e honrado Manel, filho da luzente Estrela da manhã,
e o insolente Shiva, mortal amaldiçoado pelos deuses que detêm o céu.

Foram estes que se encontraram junto à imorredoura Sé por vontade divina.
Mas o medo, flagelo de dez cabeças, apoderou-se do coração irrepreensível
de Bojo, quando viu a Noite com seu manto escuro de vícios e ardis
substituir o Sol, que sob a vasta planície líquida mergulhou.
E tomando a palavra deu conta ao grupo unido dos seus receios:
“Vejam companheiros de longas batalhas como a Noite suplanta o Dia.
Não é sem fundamento que temo o que a escuridão traz para nós,
pois todos já sofremos quando ela nos tira a lucidez dada pelos deuses.
Amigo da Noite é Dionísio, que nos dá o vinho. Este potencia os nossos espíritos
mas o seu poder embriagador atira-nos para rixas tremendas,
pois pensamos que a nossa força cresce à medida que bebemos.
Sacrifiquemos por isso a Zeus, detentor da égide, um touro de terríveis cornos
para que cheguemos a dois mil e nove apenas com gratas recordações.”

Assim falou e todos concordaram, porque dissera as palavras na medida certa.
Ginjas, que vê ao longe, tirou então da sua aljava uma seta afiada
E ajudada por Atena abateu um colossal touro que pastava
Pelos verdejantes prados que enfeitam a encosta do inexpugnável castelo.
Tomando o animal nos braços, Sapec pediu a Zeus que a Noite fosse pacífica
e depositou-o junto à entrada colossal da imorredoura Sé.
Depois de todos terem rezado, dirigiram-se para a íngreme Alfama,
onde os esperava um banquete de vastas iguarias.