quinta-feira, 8 de março de 2007

Acto de Inverno

Que luz é esta que devassa a escuridão do meu quarto? E este céu celestial pintado de fresco? E o trinar nas árvores ondulantes? Quê?! É já a Primavera? Não, não pode ser. Ainda agora fiz um chá de camomila para celebrar a entrada no Inverno. Para trás monstro primaveril! Este ainda não é o teu Tempo! Que artifícios enleantes trazes no teu bojo? Que mil promessas vãs? Quantos e quantos desejos lançados às estrelas para acabarem desfeitos em lágrimas de sal? Para trás! Não me venhas com o teu pólen alérgico que me faz chorar os olhos! Pára! Volta a apanhar o comboio que esta ainda não é a tua Estação!

Vamos Inverno! Volta a impor-te. Reclama o teu Tempo. Convoca os aliados das montanhas gélidas onde as neves são eternas! Chama as nuvens mais negras e cordas de chuva! Dá-me o frio e o recato da lareira, por favor! Quero as pantufas e as camisolas grossas de lã. Dos teus longos cabelos alvos faz cair flocos de neve. Vamos! Fere mortalmente o sol cálido, a melodia metálica dos grilos e todas as manifestações do mostrengo primaveril. Que a Natureza volte a ser árida e espectral! Que nada desponte do regaço da terra!

Sabes Inverno, a Primavera é uma puta cínica que nos arrebata para depois nos destruir implacavelmente. Nela tudo é dispersão, movimento, utopia, cor e cheiro. A razão transforma-se em loucura e o bom senso em imprudência. O sangue ferve por desejos inalcançáveis. Espero que o teu hálito gelado faça uma vez mais tremer de frio esta Primavera fora de Estação e a expulse para o fundo dos tempos…

3 comentários:

Sérgio Leal disse...

adorei :)

Marco disse...

está-se a aproximar a época crítica.. ou então não!
Muito bom Ukrania.. quem canta assim não é gago!

Anónimo disse...

és tão lindo, Rui! és um kiducho!

Catarina